Finalmente desta vez a excursão saiu; nos últimos dois anos programamos e por vários motivos a atividade acabou não acontecendo e agora já lá se vão quatro longos anos depois da nossa excursão anterior por estas belas montanhas de três estados ocorrida no feriado de 1º de maio de 2005, a então denominada “É dano que se recebe” quando tivemos a feliz participação da nossa querida e saudosa Paulinha. Partida da “Novo Rio” ao nível do mar às 19:10 num ônibus da viação “Cidade do Aço” com destino a Cruzeiro em SP e de lá até Passa Quatro em MG, onde desembarcamos nos primeiros minutos da madrugada do dia de São Jorge; lá no Rio já devem estar espocando vários fogos por conta da data.
Passa Quatro, quinta-feira 23 de abril 2009.
Desembarcamos em Passa quatro a 918m de altitude com céu magnificamente estrelado às 00:15 deste dia de São Jorge, feriado municipal apenas na cidade do Rio de Janeiro, motivo pelo qual, provavelmente a travessia neste período deverá estar exclusivamente reservada para o nosso grupo. Desembarcamos na estrada ao lado do mini caminhão do Sr. Rogério que ato contínuo nos levou para a sua garagem onde bivacaremos esta noite. Enquanto nos arrumávamos para tirar aquela soneca,
Alvorada neste primeiro dia às 04:50 e depois de ligeiro desjejum, partida 06:00 no mini caminhão em direção a Fazenda Santa Amélia (Toca do Lobo), e desta vez ele conseguiu nos levar até a entrada da trilha, o que nos fez economizar uma boa hora de caminhada; nada mal. Desembarcamos ao lado da caverninha na margem direita do rio em frente da entrada da trilha na margem oposta às 07:00 e tratamos dos últimos preparativos antes de empreender a travessia do Rio a 1.568m de altitude e finalmente iniciar a caminhada às 07:30 de uma manhã luminosa com temperatura extremamente agradável, perfeita para a atividade que faremos. Cuidado ao atravessar o rio; tem uma trilha bem em frente a este ponto, não é a da travessia; esta segue beirando a margem do rio no sentido da corrente do mesmo e só alguns metros à frente entra na floresta e começa a subir; e como sobe!
prosseguimos até o ponto de agua 09:15, na altitude de 1.868m finalmente providenciamos nossa provisão do precioso líquido para o resto do dia de hoje e todo o dia de amanhã, pois só teremos nova fonte de água na base da Pedra da Mina, nosso objetivo final do segundo dia de caminhada. Ainda fizemos mais 1 hora de pausas pelo caminho.
Os três primeiros montanhistas chegaram 13:10 ao cume do Capim Amarelo a 2.484m, perfazendo uma soma de desnível aproximada de 980m nesta ascensão. Chegamos neste ponto praticamente com 1 hora de adiantamento em relação à excursão de 2005; exatamente o tempo de caminhada economizado, entre o ponto de acampamento na Toca do Lobo e a entrada da trilha, trecho que desta feita vencemos devidamente motorizados. Às 13:35 chegaram mais 3 integrantes do grupo e os demais apearam entre 15:30 e 16:00; portanto os derradeiros só chegaram depois de 3 longas horas após os primeiros, sendo que os dois últimos tiveram que ser literalmente resgatados pelo JP e o Eugênio que voltaram para auxiliá-los.
Depois de tanto vento durante todo o trajeto, o tempo fechou e de vez em quando dava um chuvisco, mas felizmente só choveu pra valer depois que todas as barracas já estavam armadas. O visual daqui, é claro que é lindo, visão de 360º avistando cidades e montanhas de Minas e de São Paulo e as nuvens pesadas que se movimentavam a leste em contraste com céu mais aberto a oeste dava um brilho diferente ao espetáculo.
Quando acabamos de montar as duas últimas barracas a chuva desabou e tivemos que nos recolher e aproveitar para dar um descanso nos esqueletos enquanto esperávamos uma pausa no aguaceiro para prepararmos nosso jantar. E a chuva parou; corremos para cozinhar o rango, hoje temos feijoada e arroz, mas antes disso ainda fritamos umas linguicinhas para acompanhar aquele suco de uvas fermentadas que caiu muito bem no momento. Rango pronto, mal deu tempo de nos servirmos e corrermos pras barracas pois lá veio a chuva de novo e desta vez, como descobrimos mais tarde ao sairmos das barracas quando ela novamente parou, choveu granizo e daí nomeamos esta excursão como: “E Choveu Granizo no Capim Amarelo”.
Durante a madrugada choveu mais e a temperatura dentro da barraca chegou aos +2ºC, e possivelmente deve ter girado em torno dos -5 no exterior. Durante a chuva de granizo garoava dentro da nossa barraca e uma outra ficou com o piso alagado.
Capim Amarelo, sexta-feira 24 de abril.
Alvorada 06:10, depois da tempestade vem a bonança, e assim se fez; vimos um belo nascer do sol atrás da Pedra da Mina e depois do café da manhã desmontamos o acampamento e 09:00h finalmente (demoramos muito pra partir, isso vai ter consequência no final da jornada) partida para o 2º dia de caminhada com sol morno e céu azul; nós merecemos! Fizemos uma primeira pausa de 30 min na base leste do Capim Amarelo e prosseguindo nossa saga, não demorou, para a Ester lançar uma pergunta no ar: alguém aí na frente perdeu a sola da bota? Eu que na semana passada já havia destruído um par de botas na trilha do Polegar do Dedo de Deus lá no PNSO, logo olhei pro meu pé, e não deu outra, aconteceu novamente comigo.
Fizemos uma parada de uns 15min no fundo do vale antes da crista da Serra Fina e eu aproveitei para fazer uma manutenção precária na sola do pé esquerdo que caiu lá atrás; usei um pouco de cola que o Gustavo me cedeu e completei o trabalho com Silver Tape. Novamente em marcha, cruzamos mais um trecho de floresta (nesta travessia o terreno é um misto de costões, cristas, trepa pedras, florestas, capim de anta além das terríveis taquarinhas que insistem em agarrar nossas mochilas) e iniciamos a subida de mais um costão quando caiu a sola do outro pé da minha bota e quando no topo oeste deste fizemos outra pausa entre 11:50 e 12:20 mais uma vez usei meus dotes de filho de sapateiro que sou, para remendar a droga de bota. Nas duas outras edições desta travessia, até atingir este ponto já tínhamos nos desorientado umas duas vezes pelo caminho, mas desta vez conseguimos chegar aqui sem erros; estamos ficando bons neste negócio de Serra Fina!
Reiniciamos a caminhada e agora faremos um longo trecho na Crista da Serra Fina (trecho do qual se originou o nome desta Serra), mais uma vez com visual espetacular para todos os lados; um imenso vale ao norte e outro ao sul; na frente à leste a Pedra da Mina e o Maciço das Agulhas Negras e para trás a oeste o Capim Amarelo e mais ao fundo os Picos do Itaguaré e do Marins. Mais uma pausa, desta vez bem no meio da crista de 13:20 até 14:05 e está ficando tarde; neste passo essa turma não sobe a Mina hoje. Em cada parada, logicamente o grupo se recompunha, mas bastava recomeçar a caminhada e novamente se formavam 3 subgrupos; felizmente 5 elementos do total de 11 do grupo já estão na segunda repetição do trajeto e assim sendo, em cada subgrupo sempre tinha pelo menos um conhecedor do caminho a trilhar.
O primeiro grupo chegou na água antes da subida da Mina, na cota de aproximadamente 2.500m às 15:30 e os demais depois das 16 e como estes não apresentavam boas condições para enfrentar a subida da Pedra da Mina, resolvemos de comum acordo acamparmos no grande platô próximo da base oeste da Mina; na nossa primeira travessia em 2002 também acampamos neste ponto, mas por outro motivo; naquele feriado tinha tanta gente no trajeto que quando aqui chegamos encontramos alguém que nos informou que lá em cima já estava lotado. Mais uma vez, nós providenciamos o abastecimento d’água antes de partir para montar as barracas no platô a uma centena de metros do riacho. Como resolvemos acampar deste lado da Mina, amanhã teremos o mais longo dos dias desta travessia; tem gente que vai sofrer; mas é isso aí, não tem perdão, para curtir ambientes de montanhas, tem que merecer!
Mesmo sem alcançar o cume tivemos a oportunidade de apreciar um belo pôr do sol deste ponto e o sol poente projetava uma tênue luz na encosta oeste da Mina que a tornava uma visão mágica isto sem mencionar os outros picos à nossa volta e na direção do poente o Capim Amarelo se mostrava majestoso e mais ao longe o Marins e o Itaguaré; indescritível, só estando no local para dar o devido valor. Barracas montadas, pôr do sol devidamente admirado é hora de matar a fome, e desta vez sem chuva pudemos curtir aquela linguicinha frita saboreando suco de uvas vermelhas fermentado de várias procedências, antes do lauto jantar, que para o nosso subgrupo constou de lentilhas com linguiça, tudo preparado pelo chefe JP; muito bom. O céu estava meio encoberto por uma névoa baixa que por vezes se dissipava e nos permitia ver um céu inacreditavelmente belo, atualmente só possível de visualização em pontos como este completamente isolado da civilização. Por causa do céu parcialmente coberto nem fez muito frio não, possivelmente com temperaturas ligeiramente mais altas que as da noite passada.
Platô antes da base Oeste da Pedra da Mina, sábado 25 de abril.
Alvorada 05h, partida do primeiro grupo (dentre estes, os que estão com ritmo de caminhada mais lento) 07:10h, esta turma está muito mole para se arrumar e vai ter que pagar tributos por isso no final da jornada. Chegada deste grupo ao cume da Mina às 08:45; e apesar do segundo grupo ter demorado um pouco para iniciar a caminhada, por ser composto exclusivamente pelos membros mais fortes do grupão, não demorou a se juntar a nós outros no cume da Mina a 2.797m. A Pedra da Mina é o ponto culminante desta travessia e do estado de São Paulo, marca a divisa de três municípios um mineiro e 2 paulistas. Queluz / Lavrinhas (SP) e Passa Quatro (MG). O primeiro grupo chegou neste cume praticamente ao mesmo tempo em que uma turma de jovens mineiros que partiram nesta manhã da cidade de Paiolinho a norte daqui numa ida e volta tipo Pedra do Sino no PNSO. A manhã estava linda, temperatura agradável com um sol morninho e céu azul com alguns cumulus nimbus no horizonte de 360º a nossa volta e depois de muitas fotos e admiração da paisagem, às 09:40 demos prosseguimento a nossa jornada.
Descemos a Mina e entramos no Vale do Rio verde, base leste da Mina e aqui também, desta vez não tivemos dificuldade em encontrar a trilha no emaranhado de capim de anta deste baixio e logo chegamos nas margens do Rio Verde aonde de 10:25 até 10:40 fizemos uma parada para lanche e banho nas águas geladas do riacho; bem banho apenas para 5 intrépidos do grupo, os demais continuaram sujismundos até o último dia da travessia.
Depois do banho no Rio Verde e do lanche reforçado, tratamos do abastecimento d’água, que agora terá que durar até amanhã lá no Sítio do Pierre e retomamos a caminhada seguindo a margem do rio no sentido da corrente (obs: num determinado ponto deste trajeto parece que a trilha segue pela outra margem do rio; pura armadilha, não caia nessa, todo o trajeto desde a base da Mina até a subida do próximo cume é feita pela margem direita do Rio Verde) até nos desviarmos à direita para alçar nosso segundo cume do dia; ainda teremos vários outros antes da nossa meta final de hoje. Neste primeiro cume cujo nome até hoje não descobrimos, fizemos outra pausa para reunir o grupo das 12:50 até 13:10; olhando deste, vemos lá ao longe, e como está longe, o Pico do Três Estados, haja chão pra chegar lá, mas não temos alternativa senão colocar pé na trilha e deixar o cansaço pra lá; nesta altura do campeonato temos que considerar qualquer cansaço como meramente armadilha do psicológico.
Mais uma vez enfrentamos uma série de cristas recheadas de alguns cumes até alcançar o Cupim de Boi com seus aproximados 2.500m, já eram 15:55 e começou a baixar um tremendo russo o que naturalmente fez a temperatura cair drasticamente. No caminho até este ponto fizemos outras paradas para reunir o grupo e assim sendo, neste ponto o grupão chegou mais ou menos unido e às 16:10 iniciamos a descida do Cupim de Boi para a seguir finalmente empreender a última subida do dia e acampar no cume do Três Estados que atualmente, além da pirâmide triangular metálica marcando as divisas de Minas, Rio e São Paulo conta também com um mastro onde tremula uma bandeira brasileira; legal.
Os primeiros quatro integrantes do grupo a chegarem ao cume do 3 Estados o fizeram entre 17:30/17:40 e os demais só chegaram 1 hora já sob as luzes de suas lanternas , assim sendo, enquanto nós quatro curtíamos o pôr do sol do cume os outros o fizeram de pontos diversos da trilha mas o principal é que todos puderam curtir o espetáculo e mesmo com muito sofrimento de alguns, todos conseguiram chegar ao cume coroando os esforços deste longo dia, afinal de contas, boa parte daquela turma que esta manhã começou a caminhada às 07:10 está justamente no grupo que só finalizou a jornada às 18:50; portanto 11 horas e 40 minutos depois; mas o que realmente importa é que entre quase mortos e feridos salvaram-se todos.
Como na primeira noite, mais uma vez fiquei a ver estrelas enquanto o resto da barraca não chegava, se bem que desta vez não teve chuvisco, muito pelo contrário, fomos brindados com céu límpido crivado de estrelas, que maravilha; está um pouco de frio, mas nada que umas boas camadas de agasalho não possa resolver. Grupo completo, barracas montadas, os mais prejudicados se recolheram imediatamente enquanto nós outros partíamos para nosso ritual de fritar linguicinha e bebericar suco de uvas fermentadas; reconfortante depois de uma longa jornada deste o outro lado da Pedra da Mina. O rango do nosso subgrupo hoje será uma lauta macarronada especialmente preparada pela mestre cuca do Bob’s a nossa querida Xana Estrela.
Pico dos 3 Estados, domingo 26 de abril.
Alvorada às 06:00 seguido de belo espetáculo do nascer do sol por detrás das Agulhas Negras; outra maravilha de visão é o mar de belas nuvens cumulus que se estende abaixo dos cumes cobrindo as baixadas em direção ao mar; do lado oposto olhando em direção ao interior de Minas e São Paulo também temos nuvens baixas, porém ralas e sem o charme impressionante das do lado do litoral fluminense. Depois de centenas de fotos finalmente levantamos acampamento e só às 09:40 demos início ao último dia de trilha.
Nossa primeira grande parada grande até demais, foi no Alto dos Ivos onde ficamos das 11:50 até às 13:10; depois desta dificilmente chegaremos na estrada na hora marcada para a Van nos pegar. Neste último dia temos poucas subidas, mas o trajeto é bem longo e temos que enfrentar vários trechos de florestas de bambuzinhos irritantes que teimam em nos atrasar prendendo as mochilas e atacando nossas canelas. Hoje até que os dois mais lentos do grupo estavam andando relativamente bem, mas eis que no quinto final do caminho um destes torceu o pé; se já estava penoso para ele inteiro, imaginem com a patinha prejudicada. Apesar da valentia do gajo, não deu outra, ele precisou de resgate o que fez com que o atraso inicial de 1 hora em relação a hora marcada com a Van se transformasse em 4 horas, mas como diz o ditado, tudo bem quando termina bem e assim foi.
Chegada na sede do Sítio do Pierre (sede) 17:05; na Estrada 17:1 / 20 e no Rio zero hora de segunda-feira 27 de abril dando por encerrada mais uma travessia da Serra Fina, a desta vez nomeada “E choveu Granizo no Capim Amarelo”.
O Grupo: Guia JP e participantes Zé, Rodrigo Show, Ester, Dex, André Annes, Fernando Annes, Gustavo Pena, Eugenio, Moiza e Giselle; ao todo 11 felizes montanhistas.
José de Oliveira Barros