Eu sou suspeita para falar, pois desço cânions na Chapada dos Veadeiros há 12 anos; lá fiz meu primeiro curso de canionismo e me apaixonei por essa prática, que envolve o domínio de apuradas técnicas de trabalho vertical, intensa e lúdica atividade física, com caminhadas, natação, desescaladas etc. e, sobretudo, o contato com uma natureza exuberante, estonteante – muitas vezes quase inacreditável! – cujo acesso não raro só é possível com a utilização das técnicas de canionismo.

Mas o que é mesmo canionismo? É descer um rio confinado em paredões, a pé – com roupas de neoprene, porque ninguém é de ferro -, vencendo os obstáculos à medida em que vão surgindo. O acesso inicial geralmente é por trilha; a seguir, vamos caminhando por dentro d’água, ou sobre blocos, desescalando, saltando em poços, nadando por eles, e quando surge uma cachoeira, a descemos de rapel. Para mim, esse é o maior desafio, que procuro superar, mesmo com frio na barriga, para poder usufruir de todo o resto, que me faz me sentir realmente privilegiada por estar viva e poder desfrutar de tanta alacridade!

A expedição que ocorreu na semana de 4 a 11 de setembro de 2016 foi espetacular, me proporcionando as mesmas queridas sensações de prazer e bem-estar que sempre sinto, mas teve alguns elementos que a tornaram única!

O primeiro foi a descida, pela primeira vez, de um cânion dentro do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Essa foi uma importante vitória – não só para o canionismo brasileiro, como também para todo o ecoturismo no país -, conquistada por nossa anfitriã nessa expedição, a Travessia Ecoturismo. Importante frisar que a negociação da Travessia com os gestores do parque durou inacreditáveis 12 anos e a autorização foi concedida mediante o cumprimento de uma extensa lista de exigências e a estrita observância de vários cuidados com a preservação do meio ambiente.

Nós, montanhistas e amantes da natureza, só temos a aplaudir esse notável triunfo, pois, a exemplo do que encontramos em outros países, consideramos que os parques nacionais são para serem visitados e desfrutados, cabendo ao poder público o estabelecimento de regras de utilização e a fiscalização de seu estrito cumprimento, e não os fechar para “serem preservados”, como muitas vezes ocorre no Brasil.

Outra inovação sensacional dessa expedição foi termos descido o cânion Borrachudo em 3 dias, com bivaque às margens do rio do segundo para o terceiro dia. Já temos acampado, em outras expedições, com alguma estrutura, ou pelo menos com barracas, no início e no final de cada cânion; às vezes, o acesso a áreas tão remotas só é possível com essa prática. Mas dormir às margens do cânion, em redes penduradas em árvores, olhando o céu estreladão, foi único! Realmente, não existe sensação maior de comunhão com a natureza que acordar já ouvindo os pássaros ao seu lado, abrir os olhos e se deparar com os lindos paredões do cânion, ornados da belíssima vegetação do cerrado!

Além de termos desfrutado dos prazerosos atrativos desse exuberante cânion, com muitos saltos e tobogãs, e apreciado suas formações geológicas incríveis, ao finalizarmos a descida, no terceiro dia, encontramos seu proprietário, seu Augusto, que estava ansioso para nos levar a um lugar que ele mesmo havia recém-descoberto: uma belíssima ponte de pedra, gigantesca, ladeada por um incrível caverna, com um salão imenso, vários túneis, estalactites, estalagmites, certamente nunca antes visitada – nem por nossos ancestrais, já que nela não se encontram quaisquer vestígios de passagem humana.

Mais um presente maravilhoso que essa expedição nos proporcionou!!

Mas não se pense que o que não foi novo foi menos espetacular! Descemos mais uma vez o cânion Farias, um dos mais impressionantes da Chapada, com seus paredões confinadíssimos, em formações únicas! Conhecemos o cânion do Jardim, lindo e lúdico, que bem podia se chamar Jardim de Infância, por nos fazer nos sentir crianças novamente.

E, como não poderia deixar de ser, desfrutei, ao longo de 6 dias, da agradabilíssima companhia dos amigos canionistas Raquel, Eder, Márcio, Dado e Ricardo, com muitas piadas, risadas e, ao mesmo tempo, cuidado e respeito mútuos. É incrível como estar em áreas remotas, praticando atividades que envolvem um certo risco, une as pessoas, tornando-as quase uma família; ao mesmo tempo, tanta endorfina, tantos saltos e tobogãs e tantas visões exuberantes liberam nosso lado mais lúdico e engraçado, nos proporcionando prazer e diversão difíceis de se igualar e descrever!

E, para finalizar, gostaria de parabenizar e agradecer à Travessia, na expedição representa por seu líder, Ion, e pelo excelente condutor Marcelo Nissen, pelo incrível trabalho de planejamento e execução da logística da excursão e pela segurança e capacitação técnica com que todo o percurso foi realizado. Cada detalhe foi previsto e planejado. Cada risco foi calculado e minimizado. Cada procedimento, executado com segurança e precisão. Isso é para poucos! Meus sinceros parabéns!

Mônica